📝RESUMO DA MATÉRIA
- Nosso estilo de vida moderno, que exalta a conectividade constante com a Internet e atividades o dia todo, conspira para nos manter acordados por muito mais tempo do que é considerado saudável
- A recomendação padrão para adultos é dormir de 7 a 8 horas por noite. Adolescentes precisam de cerca de 9 horas, enquanto crianças em idade escolar podem precisar de mais de 11 horas
- O sono saudável consiste em 5 estágios gerais, cada estágio durando de 5 a 15 minutos, com um ciclo completo (sono leve, profundo e REM) levando entre 90 e 120 minutos. Você percorre esses estágios de 4 a 6 vezes por noite, e esse ciclo é muito importante, tanto do ponto de vista biológico quanto psicológico
- Até agora, foram encontrados 51 marcadores de DNA que parecem influenciar o sono, incluindo marcadores de longa e curta duração do sono, personalidades matutinas e noturnas, insônia e alta ou baixa eficiência do sono
🩺Por Dr. Mercola
Como jornalista médico da BBC no Reino Unido, o Dr. Michael Mosley colocou várias estratégias de saúde diferentes sob a proverbial lupa, incluindo a dieta cetogênica, sobre a qual o entrevistei em 2014.
Nesse programa da BBC, “The Truth About Sleep,” que foi ao ar em 2017, Mosley investiga as ramificações da insônia para a saúde, que é um problema que ele compartilha com muitas outras pessoas no mundo. Nele, ele analisa os perigos da privação do sono e compartilha uma variedade de métodos encontrados para melhorar a qualidade e a quantidade do sono.
Cerca de 70% dos britânicos sentem que dormem menos do que precisam, e cerca de um terço relata sofrer de insônia, diz Mosley. Seu próprio problema tem ligação com permanecer dormindo. Embora ele não tenha problemas para adormecer, ele acorda por volta das 3 da manhã e possui dificuldade em adormecer de novo. “De fato, não estou dormindo o suficiente,” diz ele.
Quanto sono é necessário para a saúde?
Como observado por Mosley, a recomendação padrão para adultos é dormir de 7 a 8 horas por noite. Os adolescentes precisam de cerca de 9 horas, enquanto as crianças em idade escolar podem precisar de mais de 11 horas.
Embora a insônia seja um dos motivos citados para a falta de sono, também existem muitas outras causas, incluindo trabalho em turnos e festas excessivas. Nosso estilo de vida moderno, que exalta a conectividade constante com a Internet e atividades durante todo o dia, conspira para nos manter acordados por muito mais tempo do que seria saudável.
Como você pode saber se está mesmo privado de sono ou se está dormindo a quantidade “certa” para você? Mosley demonstra um teste que pode lhe dar uma pista. É simples. Basta ir para a cama no meio da tarde e cronometrar quanto tempo você leva para adormecer. Para realizar esse teste de latência de início do sono, você só precisa de um relógio, uma colher de metal e uma bandeja de metal.
Coloque a bandeja de metal ao lado de sua cama e deite-se, segurando a colher na mão para que, ao cair, caia na bandeja. Precisa relaxar. Quando você começa a adormecer, os músculos da mão relaxam, fazendo com que a colher caia. O barulho vai te acordar. Olhe para o seu relógio. Quanto tempo você levou para cair fora?
Se demorar mais de 15 minutos, você está dormindo o suficiente. Se você adormecer em menos de 10 minutos, você está privado de sono de maneira moderável. Adormecer em 5 minutos ou menos é indicativo de privação de sono grave.
O que acontece quando você dorme?
O sono não é apenas um estado longo e sólido. O sono saudável consiste em vários estágios,1 cada um com duração de 5 a 15 minutos, com um ciclo completo (movimento ocular leve, profundo e rápido ou sono REM) levando entre 90 e 120 minutos.
Um ciclo de sono completo começa no sono leve e progride até o sono profundo, depois reverte do sono profundo para o leve antes de entrar no REM. Você percorre cada um desses estágios de 4 a 6 vezes durante a noite, e esse ciclo é muito importante, tanto do ponto de vista biológico quanto psicológico.
- Estágios 1 e 2 (sono leve; não REM). Durante os estágios iniciais do sono, os processos biológicos em seu corpo diminuem, mas seu cérebro permanece ativo quando inicia o processo de edição, onde são tomadas decisões sobre quais memórias armazenar e quais descartar.
Como observado por Mosley, você entra e sai da consciência no estágio 1, antes de entrar no estágio 2, momento em que suas ondas cerebrais diminuem.
- Estágios 3 e 4 (sono profundo; não-REM). Nesses estágios de sono mais profundo, você entra em um estado quase semelhante ao coma, durante o qual ocorrem processos fisiológicos de limpeza e desintoxicação no cérebro.
Suas células cerebrais de fato encolhem cerca de 60% durante essa fase de sono profundo. Isso cria mais espaço entre as células, deixando mais volume livre para que seu líquido cefalorraquidiano se livre de detritos. Antes de entrar no estágio 5 do sono REM, você volta ao estágio 2.
- Estágio 5 (REM). Durante essa última fase, você entra no sono de movimento rápido dos olhos (REM), onde ocorre o sonho. Nessa fase, seu cérebro está tão ativo quanto durante a vigília, mas seu corpo está paralisado, o que o impede de realizar seus sonhos.
A experiência assustadora da paralisia do sono ocorre quando você acorda durante essa fase e descobre que seu corpo não responde. O “tratamento” para esse distúrbio é o conhecimento. Você precisa ter o conhecimento sobre o que está acontecendo para poder enfrentar o episódio com calma, o que não dura mais do que alguns minutos.
Todos esses estágios são importantes e é importante percorrê-los várias vezes todas as noites, de forma especial os estágios mais profundos. Quando os estágios 3 e 4 são interrompidos ou ausentes, seu cérebro fica obstruído com detritos associados à doença de Alzheimer e, de fato, a privação do sono é um fator de risco para demência grave. Os estágios de 1 a 4 também são os que te fazem se sentir descansado de manhã, ao passo que o estágio 5 é importante para a memória.
Influências genéticas
Para investigar a influência da genética, Mosley envia uma amostra de sangue para análise de DNA. Simon Archer, Ph.D., cronobiologista do Surrey Clinical Research Centre, está investigando marcadores genéticos relacionados às características do sono e problemas hereditários do sono. Até agora, foram encontrados cinquenta um marcadores de DNA que parecem influenciar o sono.
Mosley possui 3 marcadores genéticos que indicam ser uma pessoa matinal. Ele também possui 5 marcadores para longa duração do sono. Juntos, esses marcadores genéticos sugerem que Mosley precisa dormir um pouco mais do que a pessoa média.
Ele também tem um marcador que aumenta o risco de insônia e outro associado à “baixa eficiência do sono em pessoas expostas a altos níveis de estresse relacionado ao trabalho,” diz Archer. Esses 2 marcadores podem ajudar a explicar a incapacidade de Mosley de dormir a noite toda, em especial quando está estressado.
Por fim, Mosley possui um marcador para aumento da sensibilidade à cafeína e interrupção do sono induzida pela cafeína. A cafeína é um culpado comum na privação do sono, embora muitos (incluindo Mosley) acreditem que “podem beber café em grande quantidade.”
Muitos também recorrem ao álcool, pensando que isso os ajuda a adormecer mais rápido. A pesquisa mostra que o consumo de álcool promove má qualidade do sono. Ao relaxar os músculos da garganta, também promove o ronco, o que pode ser problemático não apenas para quem dorme, mas também para outras pessoas da casa.
A qualidade do sono afeta a saúde do coração
Dormir mal possui uma série de ramificações preocupantes para a saúde, incluindo a promoção de diabetes, excesso de peso, doenças cardíacas, câncer e declínio cognitivo, apenas para citar alguns.
Um estudo interessante descobriu que uma noite mal dormida pode envelhecer muito o coração, colocando você em risco aumentado de doenças cardíacas em uma idade mais precoce. O coração das pessoas que dormiam 7 horas por noite apresentou sinais de estar 3,7 anos mais velho, com base na idade biológica, do que sua idade cronológica.
Pessoas que dormiam e maneira regular 6 ou 8 horas por noite, tinham corações que estavam em média 4,5 anos mais velhos que sua idade cronológica, enquanto as pessoas que dormiam apenas 5 horas ou menos por noite apresentaram eles com a maior idade biológica, 5,1 anos mais velhos que sua idade cronológica.
Outra pesquisa descobriu que, mesmo que você durma um número saudável de horas, a qualidade desse sono pode ter um impacto significativo no risco de pressão alta e inflamação vascular associada a doenças cardíacas.
Mulheres que apresentavam distúrbios moderados de sono, como demora para dormir ou despertar uma vez ou mais durante a noite, estavam "muito mais propensas a ter pressão alta do que aquelas que dormiam mais rápido e de maneira mais tranquila," relata a Forbes.
Outros impactos na saúde da privação do sono
Outros exemplos de problemas de saúde ligados ao sono insuficiente incluem:
Aumento
do risco de obesidade e diabetes tipo 2 |
Aumento do risco de problemas neurológicos, que
variam de depressão a demência e doença de Alzheimer |
Diminuição da função
imunológica |
Aumento
no risco de câncer |
Maior risco de osteoporose |
Aumento do risco de dor e condições ligadas à dor,
como fibromialgia |
Aumento na propensão a úlceras estomacais |
Comprometimento da função
sexual |
Envelhecimento precoce |
Aumento do risco de morte por qualquer causa |
Comprometimento da regulação das emoções e da
percepção emocional |
Aumento do risco de depressão e ansiedade (incluindo
transtorno de estresse pós-traumático), esquizofrenia e suicídio |
Memória prejudicada e capacidade reduzida de
aprender coisas novas |
Redução de produtividade, desempenho e criatividade |
Tempo
de reação mais lento, aumentando o risco de acidentes na estrada e no
trabalho |
A privação do sono afeta suas bactérias intestinais
Mosley também investiga como a privação do sono afeta as bactérias intestinais, sendo outra maneira pela qual pode influenciar o risco de obesidade. Conforme explicado em “A verdade sobre o sono,” as bactérias intestinais ajudam a extrair nutrientes dos alimentos que você consome e atuam como uma barreira contra agentes infecciosos.
Portanto, eles não apenas desempenham um papel crucial no seu metabolismo, mas também influenciam a função do sistema imunológico. Ao analisar amostras de fezes, os pesquisadores observaram que a privação do sono aumenta a proporção de 2 tipos de bactérias ligadas à obesidade.
A maneira como essas bactérias promovem a obesidade é através do aumento de sua absorção de energia. Quando você consome alimentos, as bactérias em seu intestino determinam em grande parte quantas calorias são absorvidas. Quando privado de sono, seu intestino se torna mais eficiente na absorção de calorias, mesmo que a quantidade de alimentos que você consuma permaneça inalterado.
Isso pode ser muito benéfico se o alimento for escasso, porém quando combinado com a disponibilidade de alimentos 24 horas por dia, tende a promover a obesidade. Segundo Mosley, a pesquisa mostrou que metade das pessoas que dormem 5 horas ou menos por noite são de fato obesas.
Pílulas para dormir estão longe de serem ideais
Pílulas para dormir são uma solução comum para aqueles que lutam dificuldade para dormir ou sono insuficiente. Mosley entrevista a Dra. Sara Kayat, uma clínica geral, sobre suas opiniões sobre pílulas para dormir. Ela apenas os recomenda e prescreve para problemas agudos e de curto prazo.
A longo prazo, eles apenas não são considerados uma boa solução, pois criam dependência. Você também desenvolve uma tolerância a eles, então acaba precisando de doses cada vez maiores para obter o mesmo efeito.
Embora não seja abordado em “A verdade sobre o sono,” a pesquisa mostrou diversas vezes que as pílulas para dormir não fornecem uma quantidade significativa de sono extra, embora tenham uma série de efeitos colaterais de certo modo perigosos.
Por exemplo, o medicamento para dormir com melhor desempenho no “Best Buy Drugs Report” da Consumer Reports para 2015, o zolpidem, permitiu que os pacientes adormecessem 20 minutos mais rápido e dormissem 34 minutos a mais, em média, em comparação com o placebo.
Da mesma forma, uma meta-análise de 2012 de dados de 13 estudos submetidos à Food and Drug Administration dos EUA, descobriu que os medicamentos Z (hipnóticos não benzodiazepínicos) diminuíram o tempo necessário para adormecer em 11 a 33 minutos (média de 22 minutos) em comparação com o placebo.
Longe de contribuir para a saúde, o pequeno aumento no tempo de sono que as pílulas para dormir proporcionam na verdade aumenta o risco de mortalidade a longo prazo.
Um estudo norueguês publicado em 2007, que incluiu dados de 14.451 homens e mulheres de 40 a 42 anos acompanhados por 18 anos, constatou que o uso frequente de pílulas para dormir aumentou o risco de morte de homens em 150% e o risco de mulheres em 170%, após ajuste para fatores de confusão.
Um estudo canadense de 2010 realizado com 14.117 pessoas entre 18 e 102 anos, também descobriu que aqueles que utilizavam pílulas para dormir tinham 1,36 vezes (136%) mais chances de morrer do que os não usuários.
Redefinindo seu relógio biológico para dormir melhor
Mosley visita a Universidade de Oxford, onde os cientistas estão investigando como o relógio biológico humano ou o ritmo circadiano influencia o sono. Russel Foster, professor de neurociência circadiana, explica como o relógio mestre em seu hipotálamo é influenciado por um terceiro sistema de detecção de luz em seus olhos.
Seus bastonetes e cones captam a luz, permitindo-nos enxergar. Mas você também tem outro conjunto de sensores de luz em seus olhos que registram os sinais do amanhecer e do anoitecer, e essas células são responsáveis por controlar seu ritmo circadiano, comunicando-se com o relógio mestre em seu hipotálamo.
Além disso, cada célula do seu corpo tem seu próprio ritmo circadiano, e todos eles são coordenados e sincronizados com o seu relógio mestre. Quando seu relógio mestre fica dessincronizado ou defasado, o que pode ser comum de acontecer se você ficar acordado até tarde assistindo TV ou mexendo em seu celular, todos os outros relógios internos começam a dessincronizar, podendo desencadear diversos problemas de saúde.
A exposição à luz artificial à noite, combinada com uma deficiência de exposição à luz durante o dia, contribui muito para a dessincronização do relógio principal e uma noite mal dormida. Mosley visita um laboratório de pesquisa em uma ilha dinamarquesa. Construída toda em vidro, a casa permite que seu corpo sincronize com o nascer e o pôr do sol.
Embora morar em uma casa de vidro seja impraticável, você pode redefinir seu relógio principal todos os dias, certificando-se de obter bastante luz solar logo pela manhã e por volta do meio-dia.
Remova telas eletrônicas de seu quarto, como TVs, laptops e celulares, e pare de usá-las no mínimo uma hora antes de dormir. Faça um esforço para manter seu quarto apenas para dormir, sem as distrações do trabalho, escola, hobbies e entretenimento.
🔍Recursos e Referências
- NIH, Physiology, Sleep Stages
- Science 18 October 2013: 342(6156); 373-377
- Sleep Health October 2018; 4(5): 448-455
- Journal of the American Heart Association 2018 Jun 9;7(12). pii: e008590
- Forbes June 28, 2018
- Indian Journal of Endocrinology and Metabolism 2017; 21(5): 758-761, Sleep Disturbances and Risk of Obesity and Type 2 Diabetes Mellitus
- Neurobiology of Aging August 2014; 35(8): 1813-1820
- The Conversation March 17, 2015
- Medical News Today September 30, 2015
- J Pain. 2013 Dec; 14(12): 1539–1552
- Brain Research Volume 1416, 6 October 2011, Pages 80-104
- Science Daily June 15, 2010
- Scientific American October 2015; 313(4)
- NHTSA Research on Drowsy Driving
- Consumer Reports July 12, 2015
- Consumerreports.org The Problem With Sleeping Pills Updated December 12, 2018
- BMJ 2012 Dec 17;345:e8343
- Pharmacoepidemiol Drug Saf. 2007 Aug;16(8):913-8
- Canadian Journal of Psychiatry 2010 Sep;55(9):558-67