📝RESUMO DA MATÉRIA
- Um estudo realizado em 2023, enumerou os efeitos globais provenientes do envenenamento por chumbo, descobrindo que são muito maiores do que pensavam
- A grande maioria (incluindo 729 milhões de pontos de QI perdidos e 5 milhões de mortes decorrentes de doenças cardiovasculares) foi observada em países de baixa e média renda
- Os pesquisadores fizeram o cálculo do custo global da exposição ao chumbo em US$ 6 trilhões em 2019, representando 6,9% do produto interno bruto global
- Um outro estudo também descobriu que crianças em todo o mundo sofrem de envenenamento por chumbo, com cerca de 1 a cada 3 crianças com níveis sanguíneos acima de 5 microgramas por decilitro (µg/dL)
🩺Por Dr. Mercola
Durante anos, o chumbo, na forma de tetraetilchumbo, foi utilizado como agente antidetonante na gasolina. A gasolina com chumbo ajudou no funcionamento dos motores, porém trouxe grandes quantidades desse metal tóxico para o meio ambiente.
O Estudo da Carga Global de Doenças, Lesões e Fatores de Risco de 2019, classificou o chumbo como sendo o 4° maior risco ambiental para a saúde, depois da poluição atmosférica por partículas ambientais, poluição atmosférica doméstica causada por combustíveis sólidos e água potável imprópria, saneamento e lavagem de mãos.
Um estudo de 2023, publicado no Lancet Planetary Health enumerou ainda mais efeitos globais decorrente do envenenamento por chumbo, descrevendo suas descobertas como um “alerta.”
A exposição ao chumbo pode contribuir para 5,5 milhões de mortes por ano
O GBD de 2019, descreveu diversos fatores para a saúde devido à exposição ao chumbo, incluindo doenças cardiovasculares, renal crónica e deficiência intelectual de desenvolvimento idiopática. O estudo estimou a mortalidade induzida pelo chumbo por doenças cardiovasculares com base apenas no chumbo que provoca o aumento da pressão arterial.
As suas estimativas para a deficiência intelectual de desenvolvimento idiopática não contabilizaram os efeitos do chumbo no quociente inteligente (QI) na maioria das crianças. Sendo assim, os economistas do Banco Mundial que conduziram o estudo Lancet Planetary Health, sugeriram que todos os efeitos do chumbo podem estar sendo subestimados.
Com os dados do GBD de 2019, a dupla conduziu um estudo de modelagem estimando a carga global, incluindo o custo da perda de QI e mortalidade por doenças cardiovasculares, resultante da exposição ao chumbo.
Eles descobriram em 2019 que a exposição ao chumbo trouxe uma perda de 765 milhões de pontos de QI em crianças menores de 5 anos, junto com 5,5 milhões de mortes em adultos decorrentes de doenças cardiovasculares. A grande maioria (incluindo 729 milhões de pontos de QI perdidos e 5 milhões de mortes decorrentes de doenças cardiovasculares) foi observada em países de baixa e média renda.
Segundo os pesquisadores, “foi estimado que 90% da mortalidade por doenças cardiovasculares e 95% da perda de QI devido à exposição ao chumbo em 2019, ocorreram em países de baixa e média renda.” Quando observaram os números pela primeira vez, o autor principal Bjorn Larsen disse “nem ousamos sussurrar o número.” Os números sugerem que o peso global da exposição ao chumbo foi de fato subestimado. A perda de QI descoberta pelo estudo foi 80% maior do que uma estimativa anterior, segundo o estudo.
Além disso, as mortes por doenças cardiovasculares ligadas ao chumbo foram 6 vezes superiores à estimativa do GBD de 2019. Os pesquisadores fizeram o cálculo do custo global da exposição ao chumbo em US$ 6 trilhões em 2019, representando 6,9% do produto interno bruto global. O estudo descobriu que "77%...do custo foi decorrente do bem-estar da mortalidade por doenças cardiovasculares, e 23%...foi devido as futuras perdas de renda decorrentes da perda de QI."
1 a cada 3 crianças podem apresentar níveis preocupantes de chumbo
Um relatório da UNICEF e da Pure Earth, intitulado Toxic Truth, também trouxe a descoberta de que crianças em todo o mundo sofrem de envenenamento por chumbo. Foi constatado que cerca de 1 a cada 3 crianças apresenta níveis sanguíneos superiores a 5 microgramas por decilitro (µg/dL), sendo considerado o nível necessária para uma ação.
Porém, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças dos EUA utilizam como referência, um valor de chumbo no sangue de 3,5 µg/dL para identificar crianças com níveis considerados preocupantes.
Com os números do relatório, até 800 milhões de crianças no mundo podem estar em risco de danos à saúde devido à exposição ao chumbo, com cerca da metade das pessoas afetadas vivendo no Sul da Ásia. No entanto, se 3,5 µg/dL fosse utilizado como referência, esses números seriam ainda maiores.
Em muitos países de baixo e médio rendimento, a reciclagem inadequada de baterias de chumbo-ácido é uma importante fonte de exposição ao mesmo. É estimado que até 50% dessas baterias sejam processadas em ambientes informais e ao ar livre, provocando a contaminação ambiental.
Qualquer pessoa está sujeita a ser exposta ao chumbo na água potável contaminada, por tinta com chumbo em casas antigas construídas antes de 1978, fumaça de cigarro e objetos domésticos baratos, incluindo brinquedos e roupas infantis.
Níveis de chumbo em adultos ligados a riscos para a saúde
Não são apenas as crianças que correm o risco de envenenamento por chumbo. Uma pesquisa publicada no The Lancet Public Health de 2018, descobriu que os níveis de chumbo em adultos estão correlacionados com um maior risco de morte, sobretudo por complicações cardiovasculares. Quase 1 a cada 5 (18%) de todas as mortes e mais de 1 a 4(28,7%) de todas as mortes cardiovasculares estão ligadas à toxicidade do chumbo.
Considerando que a exposição ao chumbo possui grandes impactos, mesmo a exposição a níveis mais baixos no ambiente pode apresentar efeitos preocupantes para população. Conforme relatado por The Allegheny Front em 2016:
"[A pesquisa] da Wayne State University, sugere que a exposição ao chumbo pode causar alterações no DNA que podem afetar muitas gerações. “Quando uma mãe consome água contendo chumbo … ela está expondo seu feto, então isso terá um efeito direto no desenvolvimento do cérebro de seu bebê,” diz Doug Ruden, co-autor do estudo e diretor de epigenômica do Instituto de Saúde Ambiental de Wayne State.
"O que a maioria das pessoas não percebe é que você também está expressando as células da linhagem germinativa, e isso pode afetar os netos, podendo ir além disso."
Além da morte prematura e das doenças cardíacas, a exposição ao chumbo tem sido muitas vezes ligada a um maior risco de problemas reprodutivos, dores de cabeça, convulsões, deficiência auditiva e visual, hipertensão, distúrbios nervosos, dores musculares e articulares, além de danos cerebrais e dificuldades para aprendizagem.
Não existe um nível seguro de exposição ao chumbo
A Organização Mundial da Saúde (OMS) afirma que não existe um nível seguro de exposição ao chumbo. Sendo uma neurotoxina poderosa, mesmo uma exposição de baixo nível ao chumbo ser capaz de afetar o desenvolvimento cognitivo, levando a pontuações de QI reduzidas, períodos de atenção mais curtos e um potencial aumento do comportamento violento e criminoso mais tarde na vida.
Além do cérebro, o chumbo pode trazer danos para o sistema nervoso, o coração, os pulmões e rins. Mas nos estágios iniciais, pode causar apenas sintomas leves, por isso muitas vezes pode passar despercebido. Os adultos expostos ao chumbo correm um maior risco de doenças cardíacas e danos renais, porém, as crianças com menos de 5 anos estão sujeitas à um maior risco de sofrer os efeitos ao longo da vida.
Conforme explicado em “The Toxic Truth,” o envenenamento causado por chumbo pode provocar danos irreversíveis, junto com efeitos cognitivos significativos:
"Crianças com níveis de chumbo no sangue acima de 5 μg/dL podem pontuar de 3 a 5 (ou mais) pontos a menos em testes de inteligência do que seus pares não afetados por chumbo. Essas reduções no QI afetam o potencial futuro das crianças, além de reduzirem suas perspectivas. Declínios cognitivos generalizados em grandes números de uma cidade ou país podem resultar em quedas na produtividade criativa e econômica em sociedades inteiras.”
O chumbo e o cálcio são muito semelhantes, o que faz do chumbo um concorrente a nível celular, capaz de alterar diferentes sistemas corporais. No seu sistema neurológico, pode perturbar os neurônios que utilizam o cálcio para transmitir informações. A presença de chumbo fará com que alguns neurônios disparem mais e diminuam os sinais em outros. O que pode alterar o desenvolvimento neurológico do cérebro nas crianças que absorveram o chumbo.
Além de problemas de comportamento e QI mais baixo, crianças mesmo com níveis mais baixos de chumbo no sangue podem apresentar um crescimento lento, além de problemas auditivos, anemia e hiperatividade. A exposição ao chumbo também pode causar problemas reprodutivos tanto em homens, quanto em mulheres. Se a exposição ocorrer durante a gravidez, pode ser prejudicial para o desenvolvimento do bebê e aumentar o risco da ocorrência de aborto espontâneo. Outra pesquisa demonstrou que o chumbo:
A terapia de quelação com EDTA pode auxiliar na eliminação do chumbo
Caso tenha níveis de chumbo elevados, deve ser cauteloso, trabalhando com um profissional de saúde qualificado que possa ajudar na remoção do chumbo sem causar mais danos no processo. Uma opção é a terapia de quelação feita com edetato dissódico (EDTA), um agente que se liga ao cálcio e a alguns metais pesados.
É muito utilizado no tratamento para sobrecarga de cálcio (hipercalcemia), porém também pode ser útil para o chumbo. Em estudo de 2016, a quelação com EDTA reduziu de maneira efetiva o risco de eventos cardiovasculares futuros, com um número necessário para tratar (NNT) de 12 para prevenir um evento cardiovascular em cinco anos. Os cuidados de saúde convencionais, ainda sustentam que a terapia de quelação com EDTA é uma forma de charlatanismo que não possui benefício perceptível.
Como o EDTA também pode extrair minerais importantes do seu corpo, ele só deve ser utilizado sob os cuidados de um médico que possa monitorar seu estado nutricional e recomendar uma suplementação adequada. Uma alternativa é a N-acetilcisteína (NAC), um precursor da glutationa, necessária para uma desintoxicação eficiente.
Foi descoberto em estudo publicado na revista Metal Ions in Biology and Medicine, que o NAC está protegido contra a genotoxicidade induzida pelo chumbo em células cancerígenas do fígado humano. Uma outra opção é ir em uma sauna para uma desintoxicação não tóxica, ajudando na remoção de quase todas as toxinas do corpo, incluindo o chumbo.
Como reduzir sua exposição ao chumbo
Diversas pesquisas mostra que o chumbo continua sendo considerado um poluente ambiental. Faça o teste de chumbo em seu filho. Todas as crianças devem ser testadas com 1 e 2 anos de idade e uma 2° vez com 3 e 4 anos caso viva em uma casa mais antiga. Sempre que houver preocupação sobre a exposição ao chumbo, recomenda-se a testagem dos seus filhos.
Você também pode fazer um teste de chumbo, caso tenha um caso de doença cardíaca. Um nível de 3.5 mcg/dL ou superior é considerado um perigoso. Para reduzir sua exposição a esse metal tóxico:
- Remova tinta com chumbo — Caso sua casa tenha sido construída antes de 1978, faça uma inspeção para determinar se há tinta com chumbo. A remoção da tinta feita com chumbo deve ser realizada por um profissional credenciado para garantir a segurança, pois o pó é de fato tóxico.
- Faça um teste de chumbo em sua água —Milhões de linhas de serviço de água mais antigas nos EUA são feitas de chumbo e podem estar transportando água contaminada para sua casa todos os dias. Um filtro específico para remoção de chumbo e com alta qualidade é sua escolha mais confiável para remoção do chumbo da água. Sempre utilize água fria e filtrada para seu consumo ou cozinhar e não misturar fórmulas infantis com água quente não filtrada da torneira.
- Verifique os objetos domésticos — Esteja ciente de que alguns objetos domésticos podem conter chumbo, como cristais de chumbo, brinquedos infantis, cosméticos e remédios. A Food and Drug Administration (FDA) dos EUA mantém uma lista de produtos que contêm chumbo.
🔍Recursos e Referências
- Britannica, tetraethyl lead
- Chemosphere. 2023 May;324:138207. doi: 10.1016/j.chemosphere.2023.138207. Epub 2023 Feb 21
- The Lancet Planetary Health September 11, 2023
- Medical Xpress September 12, 2023
- Pure Earth, Detail in New Report: The Toxic Truth
- U.S. CDC, Blood Lead Reference Value
- Pure Earth, The Toxic Truth, Executive Summary
- The Lancet Public Health April 2018; 3(4): e177-e184
- The Allegheny Front January 29, 2016
- Scientific Reports 2015; 5 Article Number 14466
- International Journal of Health Sciences, 2011;5(1):17
- Environmental Research August 2016; 149: 157-163
- Environmental Protection Agency, Learn About Lead
- American Journal of Physiology August 1, 2008; 295(2): H454-H165
- Kidney International December 2004; 68(6):2329
- Journal of the American College of Cardiology May 24, 2016
- Met Ions Biol Med 2008; 10: 419-424
- CDC Lead Surveillance Data as of 2021
- U.S. FDA, Recalls, Market Withdrawals & Safety Alerts