📝RESUMO DA MATÉRIA

  • A Comissão Federal de Comunicações (FCC) fez pela primeira vez uma multa para o provedor de TV DISH em US$ 150 mil por causa de detritos espaciais
  • A DISH não conseguiu desorbitar seu satélite EchoStar-7 de maneira adequada, levantando possíveis preocupações de segurança
  • O anúncio da FCC foi seguido por uma queda de quase 4% no preço das ações da DISH e passa uma mensagem para outras operadoras de satélite
  • É estimado que 200.000 pedaços de detritos espaciais entre 1 e 10 cm (0,4 e 4 polegadas) estejam flutuando no espaço; outros 15.000 pedaços de lixo espacial maiores que 10 cm (4 polegadas) também estão sendo rastreados, enquanto os pedaços menores podem chegar a milhões
  • Em 2022 foi o ano que mais foram lançados satélites, e não há satélites aposentados suficientes saindo de órbita que possa compensar; caso não tenha uma mudança significativa, os comportamentos espaciais dos humanos são considerados “insustentáveis”

🩺Por Dr. Mercola

A poluição na Terra piorou, atingindo o Oceano Antártico que circunda a Antártida, uma área há muito considerada intocada. Mas a poluição provocada pelo homem não atinge apenas os cantos mais distantes do globo, é lançada em órbita e no espaço exterior.

Pela primeira vez, a Comissão Federal de Comunicações (FCC) multou o fornecedor de televisão DISH em 150.000 dólares por detritos espaciais, por não ter desorbitado seu satélite EchoStar-7 de maneira adequada. Segundo um comunicado de imprensa da FCC:

“Isso marca a primeira vez na fiscalização dos detritos espaciais por parte da Comissão, que intensificou os seus esforços políticos em matéria de satélites, onde inclui a criação do Gabinete Espacial e a implementação da sua Agenda de Inovação Espacial. O acordo inclui uma admissão de responsabilidade da empresa e um compromisso para seguir um plano de conformidade e pagar uma multa de US$ 150.000.”

Satélite DISH enviado para uma altitude mais baixa, causando preocupações de segurança

O satélite EchoStar-7 da DISH foi lançado em 2002. Em 2012, a FCC aprovou um plano de mitigação de detritos orbitais apresentado pela empresa, onde afirmava que o satélite seria retirado para uma altitude de 300 quilômetros (km), ou 186,4 milhas, quando sua missão Foi completada. Manobras de saída de órbita do satélite foram estimadas pela DISH no final da missão ocorreriam em maio de 2022, com base no seu nível de combustível e outros fatores.

Em fevereiro de 2022, porém, o propelente do satélite havia diminuído, de modo que não seria capaz de completar o plano de mitigação de detritos orbitais. Em vez disso, a DISH enviou o satélite retirado para uma órbita de eliminação bem mais baixa do que o previsto, a cerca de 122 km (75,8 milhas) acima do arco geoestacionário.

A órbita geoestacionária está 35.786 km (22.236 milhas) acima do Equador. Em contrato, muitos dos detritos espaciais estão na órbita baixa da Terra, que fica a 2.000 km (1.200 milhas) da superfície da Terra. É possível que em altitudes mais baixas o satélite DISH possa causar problemas de segurança. A FCC relatou:

Foi revelado através de uma investigação da FCC, que a empresa infringiu a Lei de Comunicações, as normas da FCC e os termos da licença concedida à empresa ao transferir seu serviço de transmissão direta por satélite (DBS) do satélite EchoStar-7 ao término da missão para uma órbita de descarte inferior à elevação exigida pelos termos de sua licença. Estando em uma altitude mais baixa, poderia representar preocupações com detritos orbitais.”

Embora uma multa de US$ 150.000 para uma empresa avaliada em cerca de US$ 3 bilhões não seja um valor alto, o anúncio da FCCtrouxe uma queda de quase 4% no preço das ações da DISH, além de passar uma mensagem a outras operadoras de satélite. Michelle Hanlon, advogada espacial da Universidade do Mississippi, disse ao MIT Technology Review:

“É de fato um momento histórico para a mitigação de detritos. É um grande passo na direção certa... Eu de fato adoraria ver que, se não cumpre os requisitos de licença, será proibido de lançar por vários anos. Caso esteja dirigindo sob influência de álcool, poderá ter sua licença revogada. Esses são os tipos de medidas que precisamos.”

Qual número de detritos está flutuando no espaço?

É estimado que 200.000 pedaços de detritos espaciais entre 1 e 10 cm(0,4 e 4 polegadas) estejam flutuando no espaço. Outros 15.000 com mais de 10 cm (4 polegadas) de diâmetro também estão sendo rastreados pela Rede de Vigilância Espacial dos Estados Unidos. Os detritos espaciais menores que 1 cm, podem ser cerca de milhões.

Uma vez em órbita, os detritos não permanecem no mesmo local. Os detritos que estão baixo orbitará por alguns anos antes de voltar para a Terra. Porém, o lixo espacial que está em órbita a 1.000 km (600 milhas) no espaço pode circular durante muitos anos. Até mesmo os pequenos pedaços de detritos menores que 1 mm (0,04 polegada) podem ser catastróficos caso ocorra alguma colisão.

Além de danificar as janelas dos ônibus espaciais, os satélites podem ser destruídos. Segundo a Britannica:

“Caso tenha uma chance de 1 em 100.000 de um destroço conhecido colidir com a Estação Espacial Internacional (ISS), os astronautas realizam uma manobra para evitar colisão de detritos onde a órbita da ISS é elevada. Em ocasiões perigosas, como em Novembro de 2021, quando a ISS passou pela nuvem de detritos de um teste anti-satélite russo, os astronautas fecham as escotilhas da estação e abrigam-se nas suas naves espaciais.”

Em setembro de 2023, quase ocorreu uma colisão entre detritos em órbita baixa. Uma carga soviética de 880 libras lançada em 1976 era um dos objetos. O outro era um corpo de foguete chinês lançado em 2018 e estimado em cerca de 4.400 libras.

Os objetos passaram a 36m um do outro, com probabilidade de colisão de 1 em 1.000. Conforme relatado pelo Space.com, “Cada um estaria viajando a cerca de 7,5km por segundo, ou 16.800 milhas por hora, ao passar por cima a uma altitude de cerca de 428 milhas (689 km). Uma colisão desses detritos maiores criaria cerca de 3.000 pedaços de detritos na órbita baixa da Terra, segundo Leolabs.”

A primeira colisão em órbita aconteceu no ano de 2009, quando o Iridium-33, um satélite de comunicações privado dos EUA, sofreu uma colisão com o Kosmos2251, um satélite militar russo, onde ambos foram destruidos. O incidente gerou 2.300 fragmentos, alguns dos quais reentraram na atmosfera da Terra, provocando sua combustão.

Estima-se que o número de colisões aumente à medida que mais lixo espacial entra na equação, e espera-se que as colisões se tornem a principal fonte de detritos espaciais no futuro. Tal como está, o número exato de objetos de detritos espaciais orbitando a Terra é apenas uma estimativa.

A Agência Espacial Europeia (ESA) estima que poderão existir 29 mil pedaços de detritos espaciais maiores que 10 cm, 670 mil maiores que 1 cm e mais de 170 milhões maiores que 1 mm. A ESA explica:

“Qualquer um desses objetos podem provocar danos a uma espaçonave operacional. Uma colisão com um objeto de 10 cm implicaria uma fragmentação catastrófica de um satélite, um objeto de 1 cm incapacitaria uma nave espacial e penetraria nos escudos da ISS, e um objeto de 1 mm poderia destruir subsistemas em embarcar em uma nave espacial.
Para os cientistas, uma colisão com uma relação energia/massa superior a 40 J/g seria catastrófica.”

A síndrome de Kessler já está acontecendo?

Quando ocorrem colisões no espaço, os objetos permanecem em movimento, assim como os seus fragmentos, fazendo campos de detritos cada vez maiores e ainda mais colisões, sem retorno. O cenário foi delineado pelo ex-cientista da NASA Donald Kessler, que escreveu no seu artigo de 1978 que à medida que o número de satélites na órbita da Terra aumenta, também eleva a probabilidade de ocorrência de colisões.

“As colisões de satélites produziriam fragmentos em órbita, cada um dos quais aumentaria a probabilidade de novas colisões, levando ao crescimento de detritos ao redor da Terra,” ele previu. Na verdade, muitos acreditam que a Síndrome de Kessler já está encaminhada. Conforme descrito pela ESA:

Com a atual taxa anual de lançamento de cerca de 110, e com futuras rupturas ocorrendo a taxas históricas médias de 10 a 11 por ano, o número de resíduos no espaço aumentará de maneira contínua. O aumento da contagem de detritos trás como consequência a probabilidade do aumento de colisões catastróficas maneira progressiva; duplicar o número de objetos elevará o risco de colisão cerca 4 vezes.
Mais colisões ocorreram à medida que os detritos aumentem. Em um cenário de “business as usual,” as colisões começarão a prevalecer sobre as explosões agora dominantes dentro de alguns anos. Em última análise, os fragmentos de colisão vão colidir até que toda a população seja de fato reduzido de tamanho.
Esse processo autossustentado, sendo crítico para a região LEO [órbita baixa da Terra], é conhecido como “síndrome de Kessler.' Deve ser evitado com medidas de mitigação e remediação à escala internacional.”

Os comportamentos espaciais dos humanos são 'insustentáveis'

O Relatório Ambiental Espacial de 2023 da ESA, mostra uma situação terrível do estado do lixo no espaço, observando que “o ambiente orbital da Terra é um recurso finito.” Em 2022 foi o ano que mais foram lançados satélites, e não há satélites aposentados suficientes saindo de órbita para compensar isso.

Entretanto, satélites antigos aumentam o risco de fragmentação em “nuvens perigosas de detritos,” com os satélites ativos a terem de realizar manobras de evasão cada vez mais frequentes para se manterem em segurança. Embora a maioria das pessoas pense no espaço como sendo infinito, os satélites muitas vezes competem pelo mesmo espaço orbital.

“O espaço pode ser considerado indimensionável,” observa a ESA, “mas as regiões com valor económico podem ser de fato muito pequenas.” Em suma, existem engarrafamentos mesmo no espaço, com as órbitas muito procuradas tornando-se cada vez mais congestionadas e perigosas como resultado:

“O número de novos satélites lançados no ano passado foi dominado por aqueles que estabeleceram ou expandiram constelações comerciais de satélites em órbitas baixas da Terra. Essas constelações são lançadas para fornecer serviços como comunicações globais, mas apenas uma faixa estreita de órbitas é adequada para esses fins.
Uma colisão ou fragmentação nessas regiões orbitais seria catastrófica para o resto dos satélites em órbitas semelhantes, e para satélites ou veículos espaciais tripulados que passam por essa região a caminho de lugares mais distantes.”

Órbitas de refugo, remoção de lixo espacial entre opções de limpeza

Conforme as diretrizes de mitigação de detritos espaciais, os satélites devem deixar órbitas protegidas dentro de 25 anos após sua aposentadoria, saindo de órbita ou entrando em órbitas de “refugo” mais distantes. Embora os primeiros satélites muitas vezes não cumprissem esta diretriz, os satélites lançados mais recente têm muito mais probabilidade de cumpri-la.

A recente multa da FCC à DISH pode reforçar ainda mais a conformidade e até aumentar a procura por uma indústria em expansão, serviços de remoção de lixo espacial. Em outubro de 2023, por exemplo, o governo japonês contratou a empresa Astroscale para retirar de órbita um satélite já aposentado. A ESA também contratou a ClearSpace, com sede na Suíça, para remoção de detritos da órbita, com seu lançamento previsto para 2025.

Em 2018, o satélite britânico RemoveDEBRIS testou o uso de uma rede e um arpão para limpeza de detritos espaciais. Outro teste fez uso de uma vela de arrasto para desacelerar um satélite, permitindo que ele reentrasse na atmosfera, porém foi um fracasso.

A remoção do lixo do espaço parece ser uma solução mais sustentável a longo prazo do que enviar detritos, mas a indústria ainda não está apta para que isso aconteça. No mínimo, parece claro que deveria ter mais atenção aos tipos de objetos que estão a ser lançados no espaço, sem um plano claro para a sua remoção. No entanto, a decisão da FCC é um passo na direção certa.

“É interessante que o efeito de uma multa dessa magnitude possa apresentar uma comoção em um mercado potencial para serviços ativos de remoção de detritos,” disse Christopher Newman, advogado espacial da Universidade de Northumbria, no Reino Unido, ao MIT Technology Review. “As empresas já foram avisadas de que serão responsabilizadas pelo descumprimento das licenças. Portanto, isso deve estimular uma discussão entre essas 2 indústrias.”